Abstract
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a saúde como um dever do Estado e um direito do cidadão. Por meio do Sistema Único de Saúde – SUS, todos os cidadãos deveriam ter acesso aos serviços de saúde de acordo com suas necessidades, independentemente de sua capacidade de pagamento, inserção no mercado de trabalho ou condição de saúde. No entanto, desde sua criação, o SUS tem enfrentado um subfinanciamento crônico. A luta por recursos financeiros para garantir políticas públicas universais de saúde tem sido uma constante. Além disso, a arrecadação de impostos tem sido bastante prejudicada pela renúncia fiscal em várias áreas, com redução da arrecadação, e do montante a ser investido. A renúncia fiscal ocorre na própria área da saúde, em três modalidades principais: deduções de despesas em saúde do imposto de renda (IR) em pessoas física e jurídica, a isenção de impostos da indústria farmacêutica e de equipamentos médicos, a isenção de impostos das entidades ditas “filantrópicas”. As deduções no IR pessoa física beneficiam apenas as classes mais privilegiadas, capazes de arcar com planos de saúde ou atendimento particular, em serviços que priorizam a atenção especializada, muitas vezes com excesso de exames complementares. Em detrimento ao atendimento primário SUS, mais abrangente e barato, e acessível às classes menos privilegiadas. Mesmo com acesso aos planos de saúde, esta população continua utilizando o SUS nos procedimentos mais onerosos como hemodiálise ou tratamento oncológico. A isenção da indústria farmacêutica e de equipamentos médicos visaria à redução de preço dos medicamentos e equipamentos. Processo pouco transparente em relação aos impostos não arrecadados e valores reais de redução dos mesmos. A isenção das entidades “filantrópicas” acaba beneficiando serviços de atendimento da população mais abastada. Ainda que as entidades em si sejam “sem fins lucrativos”, muitas são locais de funcionamento de serviços privados e lucrativos. Portanto, as renúncias fiscais, na própria área da saúde reduzem a arrecadação global com ações que acabam privilegiando as classes mais favorecidas, ao mesmo tempo que indiretamente reduzem a capacidade de investimento no SUS. Este estudo tem como objetivo realizar uma revisão da literatura nacional e internacional sobre a renúncia fiscal e suas consequências para o subfinanciamento do SUS. O método escolhido para esta pesquisa foi o de revisão sistematizada da literatura cientifica, a partir da pergunta de pesquisa “O que a literatura vem disponibilizando sobre a relação entre renúncia fiscal e financiamento da saúde no contexto do capitalismo contemporâneo?”. A partir da pergunta da pesquisa identificamos os polos correspondentes: a) o polo fenômeno “renúncia fiscal”; o polo população “financiamento da saúde” e o polo contexto “capitalismo contemporâneo”. Para a elaboração da sintaxe da revisão, optou-se por trabalhar com os polos fenômeno e população, por entender que o polo contexto seria verificado quando da leitura dos títulos das publicações levantadas, mantendo apenas os que se referiam ao período posterior dos anos 1990, caracterizando o capitalismo contemporâneo. A busca exploratória foi realizada no Portal de base de dados do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde – Bireme / Biblioteca Virtual em Saúde – BVS, utilizando os operadores booleanos “OR” (entre os descritores de cada Polo) e posteriormente “AND” (entre os Polos: Fenômeno-População) para se obter a sintaxe final. Inicialmente, para a construção da expressão de Busca utilizou-se a identificação na BVS “descritor de assunto”. Após inúmeras tentativas obtivemos retorno de um número muito pequeno de publicações. Desse modo, optou-se por modificar a identificação, passando para “termo livre”, disposto na BVS como “título, resumo e assunto”. Ao utilizarmos o operador boleano “AND” entre os dois polos, foram encontradas 210 publicações, por meio da sintaxe final (("renuncia fiscal") OR ("isencao fiscal") OR ("imposto de renda") OR ("gasto tributario em saude")) AND (("Financiamento da assistencia a saude") OR ("Financiamento dos Sistemas de Saude") OR ("Recursos em saude") OR ("Alocacao de recursos") OR ("Financiamento Governamental") OR ("Gastos em saude") OR ("Alocacao de Recursos para a Atencao à Saúde")), realizada em 23 de março de 2023. Da leitura sistematizada dos títulos e resumos das 210 publicações, foram excluídos sete estudos repetidos, obtendo um total de 203 publicações. Para análise de elegibilidade das publicações foram considerados os seguintes critérios de inclusão: renúncia fiscal, arrecadação de impostos, financiamento de sistema de saúde. Foram incluídos para a seleção de análise somente artigos científicos e monografias do IPEA, publicados em português, espanhol e inglês. As monografias / textos para discussão (TD) do IPEA foram consideradas elegíveis por serem publicações revisadas por pares, portanto incluídas como material cientifico. A partir dos critérios definidos foram excluídas seis produções acadêmicas, sendo um livro, um portfólio, quatro teses, restando 197 publicações. Na sequência foi efetuada a leitura sistematizada dos títulos e resumos dos resultados encontrados, sendo excluídos 160 e 16 estudos, respectivamente, conforme os critérios acima mencionados. Restaram 21 artigos dos quais quatro não estavam disponíveis na íntegra para leitura, correspondendo a 17 estudos considerados incluídos.